A ciência da alimentação emocional e da dependência alimentar

Por Dr. Mercola

RESUMO DA MATÉRIA

  • Fisicamente, comer sob compulsão emocional pode levar à obesidade e problemas de saúde relacionados; psicologicamente, isso pode prorrogar ou te prevenir de abordar suas emoções e seu estresse
  • Três hormônios que desempenham papéis importantes na alimentação emocional e na dependência alimentar são a dopamina, o cortisol e a serotonina
  • O hormônio do estresse, cortisol, não apenas regula sua reação de luta-fuga-ou-congelamento, mas regula também o consumo de carboidratos, gorduras e proteínas pelo seu corpo. É por isso que o estresse pode disparar a compulsão por consumir junk food
  • A alimentação emocional é disparada principalmente pelo estresse e pelo tédio. Pesquisas demonstram que alimentos densos em calorias disparam o acúmulo de gordura, o que inibe seu sistema primário de resposta ao estresse
  • Pesquisas também demonstram que as pessoas procuram comidas como conforto quando se sentem isoladas, porque a comida em questão as lembra de relacionamentos emocionais fortes que tiveram antes

Alimentação emocional e dependência alimentar são problemas muito reais, e a primeira pode facilmente levar à segunda. Embora a alimentação emocional seja um fenômeno universal e não cause nenhum dano significativo a curto prazo, se você descobrir que come regularmente apenas para obter conforto, isso pode levar a problemas sérios, tanto físicos quanto psicológicos.

Fisicamente, comer sob compulsão emocional pode levar à obesidade e problemas de saúde relacionados, e psicologicamente, isso pode prorrogar ou te prevenir de abordar suas verdadeiras emoções e fontes de estresse. Como a psicóloga clínica Susan Albers disse ao Huffington Post, “… Comer para fugir dos seus sentimentos é como colocar um ‘Band-Aid’ em um braço fraturado.”

A química envolvida na alimentação emocional

Suas emoções e sua ingestão alimentar são ambas resultado de uma cascata de reações bioquímicas, e esses químicos podem ter um efeito potente. Como explicado no livro da Dra. Pamela Peeke, “The Hunger Fix: O Plano em Três Etapas Para Desintoxicação e Recuperação do Excesso de Comida e da Dependência Alimentar”, o neurotransmissor dopamina tem um papel crítico em todas as formas de dependência, incluindo o vício por comida.

O hormônio do estresse cortisol e o neurotransmissor serotonina também desempenham papéis importantes. Como relatado pelo Huffington Post:

“O cortisol é o nosso principal hormônio do estresse, que dispara nosso instinto de luta-ou-fuga. Ele também regula como nosso corpo consome carboidratos, gorduras e proteínas. Então, se estamos estressados ou ansiosos e o cortisol entra em ação, isso pode nos dar a vontade de reabastecer as reservas de carboidratos.

‘Quando estamos sob estresse, nossos corpos são inundados por cortisol’, disse … Albers. ‘Isso nos desperta desejos por comidas doces, gordurosas e salgadas.’ Depois disso, temos a dopamina, um neurotransmissor associado com o aprendizado de recompensas. Ela entra em ação com a possibilidade de que algo positivo esteja para acontecer, como comer alguma comida que você adora.

As comidas de conforto pelas quais optamos, porque elas têm um sabor tão bom, nos dão um aumento de dopamina, Albers disse, e sentimos desejo por essa satisfação de novo, e de novo … E não podemos esquecer da serotonina, também conhecida como “o químico da felicidade” … a serotonina em si não é absorvida dos alimentos — mas o triptofano, um aminoácido necessário para sua produção, é.

Famosamente associado com a carne de peru, o triptofano também é encontrado em queijos … Carboidratos também podem aumentar os níveis de serotonina, o que pode melhorar seu humor, e o chocolate também está associado a picos nos níveis de serotonina.”

Comidas de conforto baixam os níveis de cortisol em indivíduos com estresse alto

De acordo com os especialistas em transtornos alimentares entrevistados pelo Huffington Post, a alimentação emocional é disparada principalmente pelo estresse e o tédio. Essencialmente, o ato de comer “nos dá algo para fazer. Isso preenche nosso tempo ocioso, e nos oferece uma maneira de procrastinar”, diz Albers.

Uma pesquisa publicada em 2011 no periódico Psychoneuroendocrinology confirma a influência das comidas de conforto na redução do estresse, demonstrando que alimentos densos em calorias dão início ao acúmulo de gordura mesentérica — um contribuinte importante na obesidade abdominal — que inibe a atividade do eixo hipotalâmico-pituitário-adrenocortical (HPA).

O eixo HPA é o seu sistema primário de resposta ao estresse e faz a conexão entre seu sistema nervoso central e seu sistema endócrino. De acordo com os pesquisadores, “a adaptação a longo prazo ao estresse crônico frente a uma densidade calórica resulta em um acúmulo maior de gordura visceral (via ingestão de alimentos densos em calorias), o que por sua vez modula a resposta do eixo HPA, resultando em níveis mais baixos de cortisol”.

Alimentos versus sentimentos

Com o passar do tempo, o ato de comer se torna associado com alívio emocional; é uma maneira de se distanciar temporariamente do desconforto emocional e amortecer a experiência do estresse. Karen R. Koenig, assistente social clínica licenciada e especialista em psicologia alimentar, disse ao Huffington Post:

“Existem desconfortos emocionais conscientes e inconscientes. Às vezes sabemos [o que estamos sentindo], e às vezes não — apenas nos sentimos inquietos e não felizes, e não lidamos com o sentimento. Ao invés disso, nós comemos.

Depois vem o que já sabemos que vamos sentir: vergonha, remorso, arrependimento. Trocamos o desconforto inicial, que talvez seja algo não familiar ou que tememos, pelos sentimentos familiares que virão depois de comer sob impulso emocional.”

Comidas confortantes estão associadas com memórias positivas

Um estudo interessante publicado em 2015 descobriu que pessoas procuram comidas de conforto quando se sentem isoladas de alguma maneira, porque a comida em questão as lembra de uma relação emocional forte que elas tiveram antes. Os destaques deste estudo incluem as descobertas que:

  • Comidas de conforto estão associadas com relacionamentos (elas têm uma “função social”)
  • Sensação de isolamento indica o quanto as pessoas gostam de comidas de conforto
  • Ameaças ao sentimento de fazer parte de algo levaram as pessoas com apegos fortes a consumir mais comida de conforto

Aqui, um grupo de estudantes de graduação da State University of New York em Buffalo foram requisitados a se lembrar de uma época em que algum de seus relacionamentos próximos esteve sob risco, ou algum momento em que se sentiram alienados e solitários. Outro grupo não recebeu essas instruções.

Após o teste, foi descoberto que o grupo instruído a relembrar de um período emocionalmente estressante estava mais propenso a consumir comidas de conforto, e os participantes desse grupo avaliaram melhor o sabor das comidas do que o grupo que não estava comendo para apaziguar suas emoções.

Como separar suas emoções da sua alimentação

Se a alimentação emocional ataca de vez em quando, isso provavelmente não vai te causar nenhum problema. O perigo real está na alimentação emocional crônica, que pode prejudicar sua saúde e seu bem-estar emocional. Então, o que você pode fazer? De acordo com os especialistas entrevistados pelo Huffington Post, é importante separar suas emoções da sua ingestão alimentar. O Huffington Post escreve:

“Para começo de conversa, precisamos nos lembrar da verdadeira função dos alimentos — nos nutrir. De fato, Koenig sugere que o termo ‘comida de conforto’ por si só poderia ser parte do problema. ‘Um termo inadequado e enganoso como poucos, conforto não é algo que queremos manter associado à alimentação’ disse Koenig.

‘Precisamos categorizar os alimentos em nosso cérebro como nutrição e prazer ocasional. Precisamos buscar conforto através de amigos, fazendo coisas boas que nos fazem bem e participando de atividades saudáveis que reduzem a aflição interna. Assim que você começar a procurar por comida, pare,’ aconselhou Allen.

‘Pense, ‘Eu estou com fome? Eu preciso de comida em meu estômago, ou um dos meus gatilhos está disparando? O que eu preciso nesse momento?” Ambos, Albers e Koenig, disseram que deveríamos nos perguntar se realmente estamos sentindo fome por comida ou se precisamos de algum outro tipo de ação para lidar com o que estamos sentindo.”

Manter um diário é uma opção. Allen sugere anotar o que, por quê e quando você come, para te ajudar a identificar padrões de alimentação emocional. Outra sugestão oferecida por Koenig é pensar em termos de um fluxograma de sim/não. Pergunte a si mesmo questões como “Eu estou com fome? O que eu quero comer agora? O que eu estou sentindo?”

Se você descobrir que sua busca por comida é disparada por uma emoção negativa, encontre uma forma mais construtiva de abordar essa emoção. O conceito de alimentação consciente também pode ser útil. Quando você come, coloque seu foco realmente no ato de comer. Como ressaltado no artigo em destaque:

“Que bem poderia vir mesmo do petisco mais delicioso, se você está tão distraído emocionalmente que apenas come e come até o ponto em que nem sente mais o sabor, e ignora os sinais de saciedade continuando a comer até chegar ao desconforto?

Quando comemos, o objetivo é parar e realmente apreciar a refeição e seus sabores, e estar consciente de quando estamos satisfeitos … Podemos comer nossos biscoitos de vez em quando, mas devemos comê-los pelo prazer de comer os biscoitos e não como uma forma de auto-terapia.”

Dependência Alimentar — Outro problema debilitante

Se não controlada, a alimentação emocional pode facilmente se transformar em dependência alimentar, o vício por comida. Além do componente emocional guiando o comportamento, esses alimentos confortantes, tais como biscoitos e sorvetes, também são carregados com substâncias viciantes — o açúcar sendo uma das principais. Mas mesmo na ausência de alimentação emocional, a dependência alimentar pode ser um problema.

A correlação entre dependência alimentar e dependência de drogas recreativas é de fato um tanto surpreendente, e provavelmente mais forte do que a maioria das pessoas suspeita. Os pesquisadores descobriram um alto nível de sobreposição entre as regiões cerebrais envolvidas no processamento de recompensas, sejam como resultado de doces ou de drogas viciantes.

Açúcares e doces não apenas funcionam bem como substitutos para drogas como a cocaína, em termos de como seu cérebro reage a eles, mas eles podem inclusive dar uma sensação de recompensa maior. Os efeitos dramáticos do açúcar no seu cérebro podem explicar porque é difícil controlar seu consumo de alimentos ricos em açúcar quando eles são expostos a você continuamente.

A ciência da dependência alimentar

Pesquisa feita pela Dra. Nora Volkow, psiquiatra na área de dependências e diretora do National Institute on Drug Abuse (NIDA), trouxe esclarecimentos bastante necessários sobre o desenvolvimento da dependência alimentar.

Usando imagens de ressonância magnética funcional (MRI) e mapeamento com tomografia por emissão de pósitrons (PET, do inglês, positron-emission tomography), que oferecem visualizações de alta qualidade do cérebro, Volkow conseguiu demonstrar que quando a dopamina se conecta ao seu receptor, chamado D2, mudanças imediatas ocorrem nas células do seu cérebro, te levando a experimentar um “trago” de prazer e recompensa.

Embora praticamente qualquer comida possa causar prazer, apenas os “hiper-palatáveis”, alimentos com alto teor de açúcar e sal refinados e gorduras, tendem a induzir o vício quando consumidos regularmente. O motivo para isso tem a ver com o instinto natural de sobrevivência do seu corpo.

Como explicado por Peeke, a diretriz primária da sua mente e do seu corpo é a sobrevivência, e eles passam por adaptações interessantes quando a sobrevivência é ameaçada. Quando você se entrega ao consumo de muitos hiperestimuladores, seja cocaína, açúcar, álcool ou sexo, o centro de recompensas do seu cérebro reconhece que você está super estimulado, o que é percebido pelo cérebro como algo ruim para sua sobrevivência, então ele equilibra isso reduzindo suas sensações de prazer e recompensa.

Ele faz isso reduzindo a quantidade de seus receptores D2 (um processo chamado “downregulation”), basicamente eliminando alguns deles. Mas essa estratégia de sobrevivência gera outro problema, porque agora você não sente nem de longe o mesmo prazer e sensação de recompensa que sentia antes do seu vício se desenvolver, seja ele por comida ou por drogas.

Como resultado, você desenvolve uma tolerância, o que significa que você vai querer mais e mais da substância que seu vício pede, mas nunca vai alcançar o mesmo “barato” que sentia antes. E durante todo o tempo, os desejos criados pela dependência ficam cada vez mais fortes. O trabalho de Volkow também revelou que as mudanças que ocorrem nos cérebros de viciados em drogas são idênticas àquelas que ocorrem em pessoas viciadas em comida.

Independente da fonte da dependência, nota-se muito pouca dopamina se conectando com seus receptores D2 no cérebro, já que a quantidade deles foi drasticamente reduzida graças à exposição contínua à substância ou processo viciantes. Algo importante que Volkow também descobriu foi que a dependência afeta o seu córtex frontal, chamado com frequência de “o CEO do cérebro”.

Traumas no início da vida preparam seu cérebro para a dependência futura

Passar por experiências de abuso (ex.: físico, emocional, sexual), negligência ou outros traumas durante os anos de formação na infância, adolescência e início da vida adulta pode afetar significativamente o seu córtex frontal, e portanto te deixar mais suscetível à dependência.

Peeke menciona a pesquisa de Susan Mason, professora assistente da Universidade de Harvard, que demonstrou que mulheres com os maiores níveis de abuso durante a infância apresentam uma incidência 90 por cento maior de dependência alimentar. Em seu livro, Peeke também fala sobre o papel da epigenética, mencionando que existe um “ponto ideal” entre as idades de 8 e 13 anos quando o seu genoma está particularmente vulnerável à influência da epigenética.

Como vencer sua dependência por açúcar

Felizmente, existem soluções para os desejos não saudáveis por junk food. Duas das estratégias mais eficientes que eu conheço são o jejum intermitente e a dieta cetogênica cíclica focada em comida de verdade e integral.

Essas estratégias vão te ajudar a reconfigurar com eficiência o metabolismo do seu corpo e impulsionar sua produção de cetonas curativas, e com isso seus desejos por açúcar serão reduzidos drasticamente, se não forem eliminados por completo, uma vez que seu corpo comece a queimar gordura ao invés de açúcar como sua fonte principal de combustível.

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